Sara Winter, líder dos 300, presa por liderar grupo armado |
Para a entidade, os disparos de fogos de artifício na noite de sábado (13) na direção do edifício principal do Supremo Tribunal Federal, pelo grupo que se autodenomina “300 do Brasil”, são um exemplo importante de que as emoções, sentimentos de ira, raiva, desprezo, que constituem parte essencial do discurso de ódio, não podem ser tratadas de forma casuística ou natural quando já identificado que seu potencial de ação representa um perigo para o Estado Democrático de Direito, com ameaças explícitas contra a integridade de uma instituição da democracia e seus membros. “É a hipótese em que o discurso de ódio não deriva do preconceito, como nas questões étnico-raciais e congêneres, mas da intolerância, da incapacidade de conviver com a democracia e seus valores essenciais, que residem no respeito às diferenças”, define.
Por isso, a ABJD entende que cabe
à Suprema Corte averiguar até que ponto o discurso de ódio
proferido nas ruas e nas redes sociais é tolerável na democracia
brasileira, sob a justificativa de proteção da liberdade de opinião
e de manifestação. Dessa forma, analisar quais são os padrões
utilizados para definir a responsabilidade, penal, civil ou
administrativa.
“A análise do problema no plano
jurídico não pode mais utilizar a dificuldade de formatar limites
como mote para não apreciar como tese capaz de orientar decisões do
Poder Judiciário em suas diversas instâncias. Estabelecer o
recorte, em que circunstâncias determinado discurso está, ou não,
ao abrigo do princípio da liberdade de expressão ou se pode ser
objeto de limitação jurídica”, pontua.
Liberdade
de Expressão x Discurso de Ódio
Diante de uma série de
situações que se apresentam no país, como a atuação de milícias
digitais criadas para coagir e impor o medo ou o grupo “300 do
Brasil”, que promove atos de ódio contra quaisquer cidadãos que
não comunguem com suas bandeiras e limitam o direito de ir e vir,
percebe-se que existe uma clara colisão entre normas fundamentais.
De um lado tem-se a liberdade de expressão e, do outro, a proteção
à dignidade das pessoas da sociedade.
Na Ação
protocolada, os juristas destacam a forma de abuso do direito de
liberdade de expressão que ocorre por meio do discurso de ódio. “O
discurso de ódio ocorre quando um indivíduo se utiliza de seu
direito à liberdade de expressão para inferiorizar e discriminar
outrem baseado em suas características, como sexo, etnia, orientação
sexual, política, religiosa. Ou quando é adotado em ações para
invocar regimes autoritários e antidemocráticos. A exteriorização
de pensamentos contra o próprio regime democrático assume uma das
formas do discurso de ódio”, delimitam.
Para a
entidade, embora haja a proteção constitucional à liberdade de
expressão, é necessário analisar até que ponto essa proteção
contribui para a democracia ou é utilizada de forma desviante e
abusiva, redundando no descumprimento de outros preceitos
constitucionais ou mesmo na prática de crimes.
Diferente
de outros países, o Brasil não possui uma jurisprudência
consolidada acerca dos limites impostos à liberdade de expressão e
os casos continuam sendo tratados um a um. “Existe um vácuo no que
se refere ao tratamento dispensado às ações que possam contemplar
critérios gerais. Na criminalização do discurso de ódio em casos
concretos, a maior parte dos tribunais têm se utilizado de uma
interpretação própria e vem sendo ignorado que os parâmetros
adequados para esta interpretação já são previstos no direito
internacional público, por meio de tratados ou convenções em que
os países signatários estabelecem padrões para tal
criminalização”, explica.
ADPF
A Ação de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) protocolada pela ABJD
indica que as várias práticas de crime de ódio, apologia a
ditaduras, manifestações pedindo o fechamento do Congresso Nacional
e do STF, e agressões à honra de pessoas públicas, ferem a
dignidade humana, que é um dos fundamentos principais da
Constituição Federal.
“Diante de fatos que demonstram
a ocorrência de discursos de ódio proferidos por movimentos que
ocupam as ruas e praças do país, torna-se necessário analisar o
art. 1º, inciso III, at. 3º, inciso IV, art. 5º, X, XLI, XLIV,
todos da Constituição Federal, com vistas a compreender se esses
dispositivos não estão sendo violados”, conclui.
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