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Bolsonaro: tudo ao mercado (F: Carolina Antunes/PR) |
Em mais um ataque à saúde pública e aos mais pobres, Jair Bolsonaro (sem partido) sancionou com
vetos a lei que permitiria liberar as patentes de vacinas e medicamentos para a
Covid-19, ampliando e barateando o acesso dos brasileiros a esses fármacos. O
Projeto de Lei 12/2021, aprovado por ampla maioria na Câmara e no Senado, foi
desfigurado pelos vetos. O Grupo de Trabalho em Propriedade Intelectual (GTPI),
que reúne especialistas e entidades da sociedade civil, vai atuar junto ao
Congresso Nacional para derrubar esses vetos.
Na prática, o presidente vetou os parágrafos 8, 9, 10, 11 do artigo 2 e
livrou as empresas detentoras de patentes da obrigação de fornecer informações
e mesmo material biológico para que sejam produzidos os fármacos que teriam
suas patentes liberadas pela lei. O grupo de entidades vai recorrer aos
parlamentares ainda nesta sexta-feira para que os vetos sejam revertidos no
Congresso Nacional. Além disso, foi vetado o artigo 3, que estabelecia a
aplicação da nova lei já na pandemia de Covid-19. Em nota, o governo afirmou
que não utilizará licenças compulsórias para a pandemia de Covid-19.
A nova lei amplia um mecanismo já existente no Brasil, de tornar
compulsórias as licenças de fabricação ou importação de fármacos essenciais à
saúde pública. Em 2007, o instrumento foi usado para baratear e oferecer a mais
pessoas um dos medicamentos de tratamento da Aids, cujo monopólio estava sob as
mãos de uma empresa norte-americana. Pela nova lei, a licença compulsória,
conhecida como quebra de patente, poderá ser usada de forma mais ágil pelo
governo em casos de pandemia. No entanto, os vetos prejudicam a efetividade do
mecanismo.
“A obrigatoriedade do
compartilhamento de todas as informações necessárias para a reprodução da
tecnologia licenciada é parte fundamental desse projeto. O sistema de
propriedade intelectual é dinâmico e é importante que as
legislações para lidar com os problemas gerados estejam atualizadas e tragam
instrumentos efetivos para o poder público”, afirma o doutor em Ciências
Humanas e Saúde Pedro Villardi, coordenador do Grupo de Trabalho em Propriedade
Intelectual.
Se restabelecida sem vetos, a lei criará um novo mecanismo para o
licenciamento compulsório de patentes, garantindo ao país mais oportunidades de
importação ou produção local de medicamentos, vacinas, diagnósticos e outros
produtos de saúde. O objetivo é assegurar que regras de propriedade
intelectual não criem situações de desabastecimento ou abuso de preço e
inviabilizem o acesso da população.
“O veto presidencial
desmonta essa iniciativa do Congresso brasileiro, que é hoje uma das
mais promissoras no mundo quando se trata de corrigir os desequilíbrios que as
patentes estão causando na distribuição equitativa de vacinas e medicamentos”,
afirma Felipe de Carvalho, Coordenador da Campanha de Acesso de Médicos Sem
Fronteiras (MSF) e integrante do GTPI.
O GTPI aponta que o projeto sofreu oposição de empresas farmacêuticas,
que hoje controlam a produção e distribuição de vacinas e tratamentos. “A
atuação das grandes multinacionais do setor tem sido marcada por faturamentos
bilionários, aumentos regulares de preço, priorização da demanda de países
ricos e relutância em compartilhar conhecimentos que permitam ampliar a
produção e distribuição de vacinas”, aponta Villardi.